Um pouco das lendas e das histórias do automobilismo dos anos sessenta
 

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Circuitos em Campinas (SP)
Entre 1935 e 1953
 



A cidade de Campinas surgiu no século 18 como um bairro rural da Vila de Jundiaí quando no governo de D. Rodrigo Cesar de Menezes (1721 e 1730) foi aberto o Caminho dos Goiases e, logo a seguir, entre Jundiaí e Mogi-Mirim instalou-se um pouso para descanso dos tropeiros que iam ou retornavam de Goiás ou de Cuiabá, que ficou conhecido como "Campinas do Mato Grosso". O povoamento da região campineira iniciou-se a partir de 1739, com a chegada de Barreto Leme e sua gente, transformando-se no bairro rural do Mato Grosso, que se transformou em “Freguesia de Nossa Senhora da Conceição das Campinas do Mato Grosso” (1774); depois, em “Vila de São Carlos” (1797), e em “Cidade de Campinas” (1842).
Em 1767, esse bairro contava com várias famílias que viviam da lavoura, que ficou forte com a chegada da cana de açúcar e depois com a cultura do café, mas com a crise do café na década de 1930, a cidade agrária de Campinas assumiu um panorama mais industrial e de serviços. Distante aproximadamente 100 quilômetros da Capital é hoje a segunda maior cidade do interior, perdendo
apenas para Guarulhos.
 
Campinas foi a cidade que em 1935 quase teve a primazia de realizar a primeira corrida internacional de automóveis no estado de São Paulo quando três esportistas da cidade: Dante di Bartolomeu, Quintino Maudoneet e Luiz Gonzaga Goes, coadjuvados por J. Sampaio Freire, realizaram em junho daquele ano uma prova, a “Volta do Chapadão” (Circuito do Chapadão) realizado nas terras vermelhas do loteamento e com o patrocínio da Prefeitura Municipal.
A prova seria dia 16 e contaria com a participação de alguns corredores estrangeiros que haviam participado do “III Circuito da Gávea” duas semanas antes, mas a chuva destruiu boa parte da pista e a prova precisou ser adiada, causando a desistência dos estrangeiros. Mas foi realizada no dia 23 tornando-se um sucesso, sendo vencida por um jovem promissor chamado Francisco Landi, que ganhou um prêmio de 10 contos de réis e um terreno no loteamento.
 

Benedicto no Circuito da Gavea de 38 com a Alfa que participara do Chapadão em 37

Em setembro de 1937 foi disputada a segunda edição do “Circuito do Chapadão”. A prova despertou grande interesse dos pilotos, chegando a quase quarenta inscrições.
Destacada presença tinha Benedicto Lopes que retornava de sua participação em duas provas em Portugal. Seu principal adversário seria Rubem Abrunhosa que pilotava um Alfa Romeo 8C 2300 igual ao dele.
O predomínio de Benedicto Lopes foi completo, vencendo a prova com três voltas de vantagem para o segundo colocado, José Soeiro. Durante esta prova faleceu Fernando de Moraes Sarmento, vítima de acidente quando o seu carro capotou.
 

Chapadão em 1947

Dez anos depois, em 1947, foi realizado e organizado pela terceira vez o “Circuito do Chapadão” no dia 7 de setembro de 1947, dessa vez pelo A.C.Piratininga. A prova foi vencida por Chico Landi em uma disputa equilibrada com Benedicto Lopes, mas só até a quinta volta quando este abandonou por um desarranjo nos freios.
 

Chico Landi em 1948

Ano seguinte (48) a cidade novamente voltou a promover uma corrida, agora o “I Circuito Cidade de Campinas”, desta vez pelas ruas centrais, não mais no Jardim Chapadão, ficando assim o percurso: Av. Orozimbo Maia, Av. Brasil, Av Barão de Itapura, Rua José Paulino, Rua Tiradentes, Rua Sacramento, Ru Coelho Neto, Av. Francisco Glicério e av. Orozimbo Maia, totalizando 2400 metros (ver mapa abaixo).
Os jornais da época diziam ser uma iniciativa da sucursal paulista do Automóvel Clube do Brasil, “...recentemente fundada”,  e a renda teria de seu valor líquido, 80% destinada em favor das obras do Estádio do Guarani Futebol Clube e os 20% restantes distribuídos entre os pilotos dos carros de corrida e adaptados que largassem com seus carros em perfeitas condições técnicas. Os ingressos tinham o preço único de Cr$ 20,00 (vinte cruzeiros).
Os treinos foram realizados no dia 7, das 15 às 17 horas e no dia 8, das 9 às 12 horas. As inscrições que deveriam se encerrar no dia 12 foram prorrogadas até “momentos antes das eliminatórias” e as eliminatórias foram na sexta-feira anterior à prova, das 14 às 17 horas.
Todos esperavam um “duelo” entre Chico Landi e Benedicto Lopes na prova, os dois pilotos que haviam corrido no exterior e que nessa prova correriam com carros iguais, Alfa-Romeu 3000cc.
O programa previa duas provas de turismo antes do “I Circuito Cidade de Campinas” e estava assim organizado:
  9:00h - Turismo até 2000cc
10:00h - Turismo de força livre (não eram as carreteras)
11:00h - I Circuito Cidade de Campinas

Carro de Edmundo Chade

Antes das eliminatórias os pilotos puderam realizar um ligeiro treino para reconhecimento da pista, e foi nesse treino que o piloto santista Edmundo Chade ao desviar de um garoto que atravessou a pista chocou-se com uma árvore sofrendo ferimentos generalizados e fraturas, no braço e tornozelo, além de quase destruir o carro.
Com atraso em função do acidente a classificação teve início às 15:30h e começou com os carros de turismo. Na principal, Chico Landi ficou com a pole ao marcar 1’40”, seguido por Francisco Marques com Maserati com 1’42”9 e Benedicto Lopes em terceiro com 1’44”4.
A direção geral da prova ficou a cargo de Arnaldo Borghi e Artur Bastos e a cronometragem teve como chefe Lauro de Barros Siciliano. Os prêmios em disputa eram: Cr$ 30.000,00 ao 1º colocado; Cr$ 20.000,00 ao 2º; Cr$ 15.000,00 ao 3º; Cr$ 10.000,00 ao 4º e Cr$ 5.000,00 ao 5º.
No domingo da prova, 15 de agosto o publico compareceu em massa e tudo transcorreu em perfeita ordem, mas o inicio da primeira disputa atrasou, largando por volta de 10 horas, atrasando assim as demais. Após as provas de turismo alinharam os carros de corrida e adaptados na seguinte ordem:
1º pelotão: 
Chico Landi Francisco Marques Benedicto Lopes
Alfa- Romeu 3000cc   Maserati 1500cc Alfa-Romeu 3000cc
2º Pelotão:
Francisco Credentino Moacir Carlos Leite
Maserati 3000cc Maserati 1500cc
3º Pelotão:
Antonio Parra Luciano Bonini Amaral Junior
Alfa-Romeu 3200cc Ford Adaptado Ford adaptado
4º Pelotão:
José Zaza Arlindo Aguiar
Mercedes-Benz adaptado Ford adaptado
5º Pelotão:
Luiz Valente Antonio Fernandes Angelo Gonçalves
Ford Adaptado Ford adaptado Ford Adaptado
6º Pelotão:
Henrique Casini João Santo Mauro Pascoalino Bounacorsa
Alfa-Romeu 2900cc Ford adaptado Alfa-Romeu 2300cc

Arlindo Aguiar nos boxes

Dada a largada Chico Landi assumiu a ponta seguido de Marques e Credentino, Benedicto largou mal e caiu para 5º lugar. Na quarta volta a primeira desistência, João Santo Mauro, o “Jaburu”, na 11ª volta Benedicto já passou em terceiro, na 17ª volta desistiram Moacir Carlos Leite e Antonio Fernandes. Na 21ª volta Benedicto já estava em segundo onde ficou até a 27ª volta quando parou no box para trocar uma vela que estava falhando, caiu para quinto e na volta seguinte parou definitivamente, também a desistência de Luiz Valente num Ford adaptado, e faltando 7 voltas para as 50 previstas, Henrique Casini, único carioca na prova, abandonou com motor fundido, ele que correra desde a 8ª volta em segunda marcha por ter quebrado a caixa de cambio. Dessa forma apenas dez dos que largaram chegaram ao final, ficando assim a classificação:
1) Chico Landi - 50 voltas - 1h21’33”
2) Francisco Marques - 49 voltas
3) Francisco Credentino - 48 voltas
4) Antonio Parra - 47 voltas
5) Amaral Junior - 45 voltas
6) Arlindo Aguiar - 43 voltas
7) José Zaza - 43 voltas
8) Pascoalino Buonacorsa - 41 voltas
9) Luciano Bonini - 38 voltas
10) Angelo Gonçalves
Na prova de Turismo até 2000cc o vencedor foi Amaral Junior com um Fiat e na de Turismo de força livre Jaime Neves venceu com um Alfa-Romeu.

Após cinco anos sem provas na cidade a Comissão Desportiva de São Paulo do Automóvel Clube do Brasil promoveu e organizou o “II Circuito Cidade de Campinas”, previsto para o dia 31 de maio de 1953, mas que foi adiado, veja abaixo.
O percurso escolhido desta vez era um pouco menos “travado” e compreendia: Av Orozimbo Maia, Rua José Paulino, Av. Barão de Itapura e Av. Brasil retornando depois à Av Orozimbo Maia, totalizando 2250 metros (ver mapa abaixo).
No domingo correriam três categorias: Turismo e Esporte, Turismo apenas para pilotos da cidade e a principal que reuniria carros Grand Prix, Mecânica Nacional e Super Esporte.
Na prova de Turismo e Esportes 13 pilotos se inscreveram, na de Turismo local até a quinta-feira anterior à prova só haviam 5 inscritos, mas ela acabou não sendo realizada. Na principal estavam inscritos 14 pilotos, sendo 10 de São Paulo e 4 do Rio de Janeiro.
Os inscritos eram:

1

Claudio Daniel Rodrigues

M.G.

SP

2

Francisco Landi

Ferrari

SP

3

Fernando Pereira Barreto

Maserati

SP

4

Gino Bianco

Maserati

RJ

6

Henrique Casini

Ferrari

RJ

8

Luis Marco Polo

Maserati

RJ

10

Jair Melo Vianna

Ferrari

SP

15

Artur Souza Costa

Maserati

RJ

20

Raphael Gargiulo

Ford Especial

SP

22

Luiz Valente

Duchen Especial

SP

25

Ico Ferreira

M.G.

SP

30

Alberto Rabay

DeSoto Especial

SP

80

Ciro Cayres

Allard

SP

84

Pedro Romero Filho

Allard

SP

Só como curiosidade, Artur Souza Costa era filho do Ministro da Fazenda mais longevo do governo de Getulio Vargas (de 1934 até 1945), e viria a se casar com a famosa cantora Emilinha Borba em 1957.
No dia 28 aconteceu o único treino livre, onde o público compareceu em grande numero e mostrou-se muito entusiasmado, nesse dia treinaram, mas depois não participaram da corrida, Luciano Falzoni, Celso Lara Barberis, Godofredo Vianna Filho (com o carro do irmão), dos pilotos da categoria principal, Claudio Daniel Rodrigues e Fernando Pereira Barreto não participaram pois chegaram atrasados, já ao final da seção de treinos às 17 horas.
As eliminatórias realizadas no sábado transcorreram sem surpresas ou acidentes e teve Chico Landi e Henrique Casini nas primeiras posições.
O domingo, dia das provas, amanheceu com chuva, mesmo assim foi dada a largada para a primeira prova, destinada a carros de Turismo e Esporte, prevista para 30 voltas totalizando 67.500 metros.
No entanto como a chuva não passava e “
criava ameaça, para os competidores e o próprio publico...” a prova foi suspensa com apenas sete voltas realizadas (15.750 metros) e a corrida principal, adiada para a quinta-feira, dia 4 de junho, às 10 horas, com entrada franca.
A primeira prova apesar de interrompida com apenas sete das trinta voltas previstas teve seu resultado validado, na Turismo até 1500cc o vencedor foi Ângelo Juliano (Fiat 1100); na Turismo até 3000cc ganhou Ferdinando Bulgarini (Citroen), na Turismo acima de 3000cc venceu “Torpedo” (Dodge) e na Esporte até 1500cc a vitória ficou com Ciro Cayres (Fiat Comino) e finalmente na Esporte acima de 1500cc o vencedor foi “Zorro” (Morgan).
No dia 4, dos três que corriam com Ferrari, Chico Landi e o carioca Henrique Casini eram considerados os favoritos. Apesar das categorias correrem juntas, Grand Prix, Mecânica Nacional e Super Esporte, para efeito da premiação em dinheiro a classificação era uma só, por categorias só haviam taças aos três primeiros.
Na quinta-feira, com tempo bom, as 10 horas foi dada a largada, e confirmando as previsões Chico Landi venceu de ponta a ponta, colocando 2 voltas sobre o segundo, Casini, Landi completou as 50 voltas em 1h03’53”5, com a velocidade média de 105,468 km/h, foi dele também a melhor volta da prova, 1’14”5, média de 108,360 km/h.
Dos 14 inscritos só 11 largaram, e durante a prova Jair de Melo Vianna parou por problemas mecânicos, sendo ajudado por Raphael Gargiulo que parou para ajudá-lo a empurrar o carro para fora da pista, sendo Jair desclassificado, pararam também por quebra durante a prova: Fernando Pereira Barreto, Claudio Daniel Rodrigues, Ico Ferreira e Ciro Cayres. Ao término da prova Gino Bianco, após receber a bandeira quadriculada, ao invés de completar mais uma volta parou o carro e entrou de marcha-a-ré nos boxes.
A classificação ficou assim:
1) Chico Landi - 50 voltas
2) Henrique Casini - 48 voltas
3) Gino Bianco - 46 voltas
4) Alberto Rabay - 45 voltas
5) Luiz Valente - 44 voltas
6) Raphael Gargiulo - 39 voltas
No dia 9 de junho a Comissão Desportiva de São Paulo do Automóvel Clube do Brasil analisando uma carta enviada por Jair de Melo protestando de sua desclassificação e fazendo acusações à João Ribeiro, diretor da corrida. A Comissão, depois de entrevistar o piloto, considerou muito áspera para com o Diretor da prova, autoridade máxima do evento e resolveu suspender por 60 dias o piloto. Foram penalizados também, com menos rigor, os pilotos Raphael Gargiulo que parou seu carro na pista para ajudar Jair a  empurrar o carro, deixando o dele momentaneamente na pista, e Gino Bianco por manobra irregular prevista no Código Esportivo, mas a pena dos dois foi uma multa de Cr$ 500,00 e uma advertência por escrito.

Alberto Rabay em seu DeSoto Adaptado, olhem só a farda do policial! Chico Landi e sua Ferrari vencedora, reparem a publico numeroso Raphael Gargiulo em seu Ford Adaptado, ao fundo o Instituto Biológico
Fotos "emprestadas" do excelente Blog: http://pro-memoria-de-campinas-sp.blogspot.com, vale a pena uma visita


Acrescentada dia 7 de fevereiro de 2012
 
 

 


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